24.1.12

Moral, vegetarianismo e crueldade animal.

Pensados os desenvolvimentos e a sofisticação da nossa moral, junto com o avanço técnológico, me parece razoável afirmar que o vegetarianismo é uma decisão acertada e justa. Ele não resolve todos os problemas do mundo, mas pelo menos poupamos parte do corpo do mundo do nosso voraz apetite. Isso nem sempre foi uma escolha válida pensando em sobrevivência, mas hoje em dia é sim, pelo menos pensando em uma parte do problema.
A questão é que os problemas são sempre ramificados e gigantescos e vivemos num mundo de relação tão interligadas que fica dificil não pensar nas implicações disso, como por exemplo as pessoas que tiram sustento da venda de carne e derivados animais. É bem possivel que se diga: "mas esses que se fodam! E arrumem outra coisa pra fazer!" Porém com isso se abre o prescedente moral para a seguinte resposta: "Que se fodam vocês, ninguem paga minhas contas!". A moral só opera por dilemas, ela só existe em tensões, por isso mesmo frágil e muitas vezes ineficiente ou hipócrita.
Não se pode isolar problemas e ignorar suas muitas relações e implicações. O pensamento cartesiano opera assim há um bom tempo e o resultado não é animador, estamos pagando a inconscequencia de quem pensa no presente sem imaginar futuro. O mundo não é monte de blocos organizáveis, mas sim água fluida misturada com vapor rarefeito... não se isola uma gota do oceano. A implicação mais óbvia do pensamento segmentado quando se trata das relações entre as pessoas, é o conflito. Ninguém fica feliz que lhe joguem na cara o quanto seu comportamento é moralmente condenável, até porque na prática as relações daninhas do nosso mundo são tantas que é impossivel não se estar comprometido com ao menos um crime hediondo.
Quando pregamos ardentemente contra a crueldade animal não pensamos na sua raiz, que seria aos meus olhos a transformação conceitual dos animais em objetos. Isso acontece com quase tudo nas relações capitalizadas, tudo pode ser comprado como um bem, objetos propriamente ditos à serviços, pessoas, etc. Essa transformação vai além de usar a força de trabalho do animal no campo, ou de não conseguir ver o boi além do hamburguer. Ela chega na nossa relação com animais de estimação, que são verdadeiros objetos afetivos. Na nossa carencia irracional e consumista destituimos, cães, gatos e pássaros de suas naturezas, impregnando os mesmo com neuroses humanas. Caçadores habilidosos e ferozes são reduzidos à bichinhos de pelucia animados, comedores de ração preguiçosos e fragéis, desequilibrados, indecisos entre o humano e o animal. Quantos animais de estimação não apresentam distúrbios bizarros como obesidade, auto-mutilação, depressão... sem citar as pessoas que sofrem por conta dos animais que vivem nas ruas, sendo que eu acredito realmente que esses animais estão muitas vezes mais felizes nas ruas do quem em lares "aconchegantes". Eles são mais animais nas ruas, que possivelmente são menos hostis que os ambientes naturais. É injusto reduzir toda a nobreza e força de um predador à mero objeto afetivo, um escape de tensão com nome fofo, com identidade fragmentada, como a nossa. Eles estão mais afinados com a canção do mundo que nós... não precisam dos nossos problemas, das nossas armadilhas de conforto...
Pensar na nossa relação com os animais me ajuda a perceber como a moral é frágil. Imagino que no momento em que a humanidade se deu conta que tinha criado regras de conduta, isso pareceu uma boa idéia. Mas com o tempo percebeu-se que cada regra abre um leque de dilemas.
A imagem que eu tenho da moral é a de uma casa sólida e simples, com muitos apendices e "puxadinhos", tantos ao ponto do insustentável... e a casa pode cair a qualquer momento.

Eu não tenho nenhuma base teórica para discutir moral. Por isso será sempre bem vindo quem puder contribuir para tornar as idéias que apresento aqui mais coesas e claras.